Por esta época, quem passar pela frente da casa de Sandra, na rua Geraldo Rebelo, pode encontrar as frutas à disposição
Frutas espalhadas pelo chão, estragando, cortam o coração de Sandra Dias, 58 anos. O terreno onde mora tem um pequeno pomar, que dá mais frutas do que se pode consumir e ela sempre divide o excedente com vizinhos, com alguém que faz uma entrega ou com quem a visita. Mesmo assim, goiabas, laranjas, poncãns e abacates continuavam sobrando aos montes.
No ano passado, Sandra até esboçou um cartaz com os dizeres “doando goiaba” e fixou no portão, mas ninguém pareceu notar. Este ano, porém, ela viu uma reportagem na televisão sobre um senhor que pendurava frutas no muro de casa para oferecer a quem estivesse de passagem e pensou: “por que eu não posso fazer isso também?”.
Colocou uma cadeira, em frente da casa, na rua Geraldo Rebelo, no XV de Novembro. Junto, pequenos cartazes escritos à mão e as frutas em sacos plásticos. Quando a filha Dafnny postou uma foto em um grupo no Facebook, logo várias pessoas correram para buscar suas frutas, para felicidade de Sandra. “De forma alguma eu faço isso para me exibir, pelo contrário, sou até muito reservada. Eu gosto é de dar para os outros o que está sobrando para mim. Não faz sentido deixar estragar”, comenta.
Sandra é de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, mas já mora em Tijucas desde 1999 – também já havia morado na cidade na adolescência, quando os pais descobriram a cidade, mais tranquila que a capital gaúcha. Anos mais tarde, já com quatro filhos, ela mesma decidiu morar aqui quando cansou da violência no Sul: o filho mais velho, Maique, tinha 14 anos quando foi assaltado, teve uma arma apontada para a cabeça, e a mãe decidiu que aquilo era demais.
Em Tijucas, Sandra passou a trabalhar como agente comunitária de saúde e viu de perto as dificuldades de muitas famílias. Atuou até 2010, quando precisou parar em virtude de um problema no joelho direito, mas conheceu realidades difíceis e soube da importância da solidariedade. “A gente tem que aprender a doar, a repartir, a ser solidário. A pandemia chegou para acordar as pessoas, para refletirem sobre a vida, perceberem que o importante é se doar, ser útil”, pondera.
Enquanto Sandra conta sua história, a porta da casa entreaberta, é possível avistar o portão da casa. Numa bicicleta, uma senhora carrega uma menina, que deve ser sua filha ou neta. Param, observam e recolhem um saco com frutas. Sandra sorri com os lábios, com os olhos, com o corpo inteiro. “Isso me enche de felicidade”, garante.
Ela acha que não faz nada demais. Considera que, se uma atitude assim tão simples, chama tanto a atenção – a ponto, por exemplo, de ser tema desta reportagem – é porque algo está errado. “Quando a bondade, a gentileza, a solidariedade e o respeito forem coisas normais, o ser humano evoluiu. Eu tenho isso como um mantra”, afirma. Até lá, dona Santra, siga compartilhando a fertilidade do seu quintal, porque a sua parte, certamente, está sendo muito bem feita.
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