“O pedido de impeachment é um procedimento político, mas precisa ter início com base jurídica”
O presidente da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, deputado Julio Garcia (PSD), acatou parecer da Procuradoria Jurídica do Parlamento estadual e dará prosseguimento ao pedido de impeachment do governador Carlos Moisés da Silva (PSL) e da vice Daniela Reinehr (sem partido) por suposto crime de responsabilidade na concessão de aumento salarial a procuradores do Estado. A decisão foi anunciada pelo chefe do Legislativo no início da sessão da última quarta-feira.
Julio Garcia também informou ao plenário os pareceres da procuradoria a outros quatro pedidos de impeachment que deram entrada na Assembleia no decorrer deste ano. Todos recomendaram o arquivamento das representações e foram acatados pelo presidente. Uma sexta representação ainda aguarda manifestação da procuradoria.
A representação que prosseguirá em tramitação na Alesc foi apresentada pelo defensor público Ralf Zimmer Junior. Para ele, Moisés e Daniela cometeram crime de responsabilidade na concessão de aumento salarial, em 2019, para os procuradores do Estado por meio de decisão administrativa, visando à equiparação dos salários dos procuradores do Executivo com os procuradores do Poder Legislativo. No entendimento do defensor, tal equiparação é ilegal, o que configuraria crime de responsabilidade, passível de processo de impeachment. Além disso, o autor argumentou que o aumento foi concedido de forma sigilosa, sem autorização legislativa.
O presidente da Alesc reiterou que a decisão de dar sequência ao pedido de impeachment foi tomada com base no parecer da procuradoria. “O pedido de impeachment é um procedimento político, mas precisa ter início com base jurídica”, disse. “Essa Presidência pretende conduzir esse processo de forma isenta, respeitosa, responsável, honrando Santa Catarina, honrando a Assembleia Legislativa”, justificou.
Outras quatro representações por crime de responsabilidade tiveram parecer pelo arquivamento, o que foi acatado pelo presidente da Alesc. Em 31 de março, Jairo Vieira dos Santos entrou com pedido de impeachment com base nos decretos restritos em função da Covid-19, que feririam princípios constitucionais. Conforme a procuradoria, o pedido não deve ser recebido por ausência de documentação.
Em 14 de abril, Alexander Alves Pereira e Maycon Marcelino da Silveira entraram com representação contra o governador com base nos decretos restritivos em função da Covid-19, em gastos de publicidade do governo, na iluminação cênica da Ponte Hercílio Luz e na instalação do Hospital de Campanha de Itajaí. Em 6 de maio, pelos mesmos motivos, acrescentando-se a compra dos 200 respiradores artificiais, Leonardo Gabriel da Silva e João Ricardo Padilha Santos apresentaram outra representação contra Moisés. Nesses dois pedidos, a procuradoria entendeu que não há configuração de crime de responsabilidade, pois o governador agiu dentro de suas competências constitucionais.
No dia 12 de maio, os deputados Maurício Eskudlark (PL) e Ana Campagnolo (PSL), além de Jeferson da Rocha e Newton Patrício Crespi, apresentaram denúncia por crime de responsabilidade contra o governador por vários motivos, entre eles os decretos restritivos em virtude da Covid-19, a instalação do Hospital de Campanha e a compra dos respiradores. Para a procuradoria, não foi demonstrada prática de crime de responsabilidade.
No dia 13 de maio, o deputado Ivan Naatz (PL) apresentou pedido de impeachment do governador e da vice-governadora também com base no aumento salarial dos procuradores do Estado. O parlamentar levou em consideração decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SC) sobre a ilegalidade do reajuste. A representação de Naatz ainda está sob análise da Procuradoria Juridica da Alesc.
Com o recebimento da representação, a Procuradoria Jurídica da Assembleia Legislativa iniciou ontem a análise da legislação que trata do processo e do julgamento de governador e vice-governador por crimes de responsabilidade. O objetivo também é estabelecer um cronograma para o trâmite da representação contra Moisés e Daniela na Alesc.
Quais os próximos passos do processo de impeachment:
Comunicação e prazo para defesa
Os prazos para essa resposta do governo ainda são incertos. Até a noite desta quarta-feira, a Alesc afirmou que o governador ainda não havia sido oficializado da abertura do processo porque havia dúvida quanto à “compatibilidade de prazos” estabelecidos no regimento interno da Alesc, na Constituição e no próprio entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff (PT). Sem esses prazos definidos, a comunicação ao governador ainda não havia sido enviada, e os prazos das próximas etapas ainda não estavam contando.
Comissão de deputados analisa processo
Ao mesmo tempo em que aguarda as respostas do governador, a Alesc também cria uma comissão com nove deputados estaduais para avaliar o caso. A divisão atende à proporção das bancadas partidárias. A análise leva em conta todos os argumentos do pedido de impeachment e ouve também as autoridades acusadas.
Esse grupo de deputados elabora um parecer defendendo que o caso seja ou não levado a julgamento no Legislativo. No regimento interno da Alesc, o prazo para a elaboração desse parecer é de 15 dias após a instalação da comissão.
Votação em plenário
Ao final do trabalho da comissão, o parecer é enviado a plenário para que todos os 40 deputados possam votar e decidir se o processo vai ou não a julgamento. É necessário aprovação de 2/3 dos deputados (27 votos) para que o processo siga para julgamento. Caso contrário, é arquivado.
Se os deputados decidirem por maioria qualificada levar adiante o processo de impeachment, o governador é afastado temporariamente por até 180 dias, enquanto o processo não é julgado pelo Legislativo.
Julgamento em comissão mista com membros do TJ-SC
Se aprovado o julgamento, além do afastamento temporário, é formada uma comissão com cinco deputados estaduais eleitos em plenário e cinco desembargadores do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) escolhidos por sorteio. Quem coordena essa nova comissão é o presidente do TJ-SC, desembargador Ricardo Roesler. A comissão se reúne para analisar as argumentações de defesa, de acusação, ouvir possíveis testemunhas e, por fim, votar pela condenação ou não no processo de impeachment. A condenação também exige o voto de 2/3 dos membros da comissão especial. Caso contrário, o processo é arquivado.
Caso o governador seja afastado durante o processo de impeachment, quem assume o cargo temporariamente é o presidente da Assembleia Legislativa – até o fim deste ano, o deputado Julio Garcia (PSD). Caso o presidente da Alesc não possa assumir, quem deve ficar no cargo é o presidente do TJ-SC.
Se o impeachment do governador e também o da vice-governadora avançar na Assembleia Legislativa e for aprovado pelos deputados estaduais até o fim de 2020, o Estado pode ter eleições diretas para o período restante do mandato.
Se o impeachment de Moisés e Daniela for aprovado, mas isso ocorrer a partir de 2021, Santa Catarina teria uma eleição indireta, na qual apenas os 40 deputados estaduais elegem um nome para governar o Estado.
*Cronograma elaborado pela NSC
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